Consolidação das escolas será a realidade do setor em 2021

Por Ricardo Luiz de Jesus (*)

Aumento da inadimplência, redução das receitas por conta de descontos e necessidade de mais investimentos em tecnologia. Além da forma como vão conduzir a volta às aulas no próximo ano, a gestão do caixa será um desafio das escolas particulares neste cenário pós-pandemia, o que deve provocar uma nova onda de fusões e aquisições no setor.

A educação básica contempla 85% dos alunos em idade escolar, o que representa 48 milhões de alunos e é considerado bastante pulverizado no Brasil. Existem cerca de 40 mil escolas privadas de educação básica no país, com uma média de 300 alunos. O ticket médio fica entre R$ 500 e R$ 600, o que corresponde a uma receita mensal entre R$ 150 mil a R$ 180 mil. O estado de São Paulo, devido à concentração de renda, conta com escolas maiores (entre 500 e mil alunos) e estas são as mais assediadas por grandes grupos e fundos de investimentos.

Com a pandemia, que levou ao aumento da inadimplência e pressão dos pais por descontos da mensalidade, a situação financeira das escolas, que já não era das melhores, piorou. O fato é que o custo se manteve, mas as receitas decaíram, o que provocou o aumento do descolamento entre receitas e despesas, principalmente quando se trata do ensino infantil. Neste caso, não há a obrigatoriedade de os pais manterem seus filhos na escola e houve grande evasão de alunos. A saída ocorreu por três motivos: como realizar atividades remotas com crianças de 0 a 5 anos? Segundo, para a maioria dos pais, só faz sentido manter os pequenos na creche ou escola se for para a criança ser cuidada por alguém e interagir com outras crianças. Por último, mas não menos importante, as famílias brasileiras sofreram com a perda da renda, de modo que cortar custos se tornou uma prioridade.

Para se ter uma ideia, um levantamento realizado pela Editora do Brasil em junho deste ano com 821 escolas, demonstrou que mais de 60% das instituições perderam 10% das matrículas. Outros 20% afirmaram que perderam mais de 30%. É preciso lembrar que, apesar do número reduzido de alunos e das atividades terem se transformado em remotas, não é possível reduzir os salários e encargos com professores. Além disso, a oferta de atividades online e aulas deste tipo levaram à necessidade de investimentos imprevistos em plataformas de ensino.

É preciso observar ainda que grande parte das escolas privadas não contava com reserva de emergência para imprevistos, pois já sofriam com a perda de alunos desde 2016, o que piorou a margem de lucro, que atualmente é muito baixa. Muitas vezes, parece até que falar em lucro quando se trata de ensino é pecado. Isso ocorre porque muitas tradicionais instituições de ensino focam demasiadamente na proposta pedagógica e não na gestão do negócio em si. Desta forma, a gestão financeira, cerne de qualquer empresa, não é profissionalizada, o que dificulta ainda mais a sobrevivência do negócio em tempos de crise onde a especialização é fundamental para garantir os recursos necessários para o pleno funcionamento das escolas.

Outro ponto importante é que por ser um negócio familiar, a maioria das escolas convive  agora com problemas de sucessão, pois em um grande número de escolas tradicionais os sócios-fundadores estão com idade avançada e não têm sucessores com um envolvimento com o negócio para dar continuidade ao projeto pedagógico.

Todos esses fatores combinados  geram a possibilidade de entrada de novos players, e dado o histórico de sucesso na criação de grandes grupos educacionais que promoveram  a consolidação que ocorreu na educação superior, há muitos fundos de investimentos e grupos estratégicos que têm olhado para segmento com muito interesse.

É fato que as escolas têm a característica de serem negócios pequenos em termos de faturamento e gestão e isso permite a possibilidade de uma entrada desses grupos promovendo uma consolidação, como ocorreu no ensino superior. Em geral, as operações já realizadas consistiram em pagar uma parte da transação em dinheiro e outra que envolve a retomada do nível de alunos de anos atrás, e contempla os donos das escolas nesse processo de transição para não haja perda alunos. Assim, depois de 2 ou 3 anos o fundador sai com um prêmio dado de acordo com as metas definidas no processo de compra.

A grande maioria das escolas particulares está aberta a ouvir propostas. Mas, o empresário precisa estar bem assessorado para tomar uma decisão segura e fazer a melhor negociação, dado que o objetivo do grupo estratégico com capital na manga é acabar comprando bem, ou seja, com o máximo desconto possível.

* Ricardo Luiz de Jesus é mestrando em administração pela EAESP – FGV com a tese “Aprimorando a Gestão Financeira em Escolas Particulares de Educação Básica” e sócio da MRD Consulting