Proposta de reforma tributária incentiva o nanismo empresarial

Por André Macedo (*)

A proposta de Reforma Tributária que se encontra na Câmara dos Deputados vai aprofundar um dos problemas estruturais mais graves da economia brasileira: a concentração da renda. Primeiramente, é preciso lembrar que não se trata de uma reformulação completa. Seu foco é a renda e em nada irá combater a regressividade da tributação sobre o consumo, muito menos vai trazer qualquer tipo de simplificação da cobrança de tributos. E, como está, o que a mudança incentiva o nanismo empresarial ao aprofundar as distorções atuais.

Não à toa, mais uma vez a votação foi adiada. Motivos para isso há de sobra. As consequências da reforma são obscuras. O relator da proposta, Celso Sabino (PSDB-PA), não deixou claro os impactos nas contas públicas e qualquer número que se possa chegar não passa de especulação. Do lado do empresário, fica a frustração. O principal problema atual da carga tributária brasileira é a sua complexidade. Estimativas dão conta que as grandes companhias gastam cerca de 1,5% do seu faturamento com obrigações acessórias. A simplificação por si só, portanto, já significaria desoneração, ganho de eficiência e, por consequência mais investimentos.

Taxação dos lucros em 20%

Mas o que mais pesa no projeto é a tributação de lucros e dividendos, que levou a votação a ser adiada. A proposta prevê a taxação dos lucros em 20%. O fato é que o ganho do empresário é residual e envolve uma série de riscos. Depois de investir recursos, empreender, pagar os funcionários, fornecedores, quitar as dívidas de crédito e com o próprio governo, o empresário retira o valor residual (lucro). E aí, novamente, teria que pagar imposto novamente.

Sem entrar no mérito especificamente do instrumento de tributação de lucros e dividendos, o que se quer alertar aqui é que, apesar da promessa de redução de tributação nas empresas, vai ocorrer exatamente o contrário; A carga tributária que se vai impor aos médios e grandes negócios, globalmente falando quando envolve a distribuição de lucros e dividendos, vai aumentar.

Isso decorre do fato de o relator ter incluído algumas isenções, como para empresas optantes do Simples e Regime de Lucro Presumido com ganhos anuais de até R$ 4,8 milhões. A pergunta que fica na cabeça é o que eu ganho ao crescer? A resposta é clara: mais dívida tributária.

Um país pejotizado

O empresariado faz as contas e, não é à toa, que muitos decidem abrir dois ou mais CNPJs para dividir o faturamento e continuar na opção do simples. O número de abertura de empresas cresce, mas isso impacta o PIB? Praticamente não.

É preciso lembrar ainda que o Brasil é um país pejotizado. Na verdade, a maioria das empresas existe para pagar o salário do dono, um prestador de serviços contratado pelas grandes companhias. O Mapa de Empresas, publicado pelo Ministério da Economia, retrata exatamente esta realidade. No cenário econômico brasileiro perpetua-se a predominância das atividades do setor terciário da economia, relativas ao comércio e prestação de serviços, que representam 82,4% dos negócios em funcionamento por aqui.

No primeiro quadrimestre de 2021, o documento destaca que existiam mais 17.173.284 empresas ativas, considerando matrizes, filiais e microempreendedores individuais (MEI). Deste total, 69,64% eram do tipo MEI ou 11.959.354 de CNPJs. Outras 984.250 classificadas como EIRELI – Empresa Individual de Responsabilidade Limitada. Em outras palavras, 75,4% das empresas brasileiras só existem para que o trabalhador possa emitir nota fiscal e receber seu salário.

Incentivo ao nanismo

Outro dado interessante é que do total de empresas que não são MEIs (5.213.930), cerca de 5 milhões são classificadas como micro e pequenas e, destas 4,2 milhões estão no Simples Nacional, ou seja, têm faturamento de até R$ 4,8 milhões, por ano.

Somos um país de empresas nanicas porque há um incentivo para permanecer no nanismo. Faturar mais do que R$ 4,8 milhões se torna um pecado capital, pois requer enfrentar uma legislação complexa e gastos elevados com impostos e obrigações acessórias.

Ou seja, quem é grande vai continuar sendo grande. Quem é pequeno continua sendo pequeno, pois não suporta o caminho do crescimento para ganhar competitividade com os gigantes de mercado. Para que um caminho de crescimento seja trilhado, é preciso dar menor complexidade e coibir o distanciamento tributário que já existe entre os optantes do regime diferenciado do Simples Nacional e aqueles que precisam sair dele. E não é dando mais incentivos fiscais aos pequenos na tributação dos lucros e dividendos que se vai conseguir atingir esse objetivo. O contrário. Precisamos criar instrumentos de incentivo para o crescimento. Quanto mais faturar, melhor. Quanto mais lucrar, melhor. Essa é a trilha a ser buscada.

* André Macedo é contador e advogado com Especialização em Direito Tributário e Gestão Pública. Foi Secretário de Tributação do Município do Natal (2009-2012) e atualmente é Assessor Técnico da ABRASF. Para o mercado privado, atua como consultor com ênfase em tributação, além de ser auditor independente certificado pelo IBRACON e conselheiro de administração pelo IBGC. Sócio da MRD Consulting e Contabilidade.